27 de junho de 2011

Cavaleiro da Lua

- Eu virei cavaleiro da lua quando abriram as portas do inferno, e lutei com o diabo na rua em que deus decretou o eterno.

Meteoros cruzam os céus como os fogos de artifícios em dias de ano novo. Sereias fogem do mar com rostos preparados para batalha. Terremotos reorganizam nações e oceanos giram e giram em seus contos do número final de seu recital musical. Os Senhores dos ventos cortam o fogo que invade nossas ruas e chuvas fazem caminhos inversos e do chão sobem para banhar os céus.

Cavaleiros dourados invadem nossas TVs, algo fantástico de acontecer, pois a única energia elétrica que vejo de pé é a dos raios que cortam o que sobra dos céus. Então como conseguimos ver TV? Esses cavaleiros lindos e coloridos por cores fortes e bem visíveis, falam em minha língua. Falam coisas confusas que nem meu doutorado faz compreender.

- Amor, o que está acontecendo?

Mas uma pergunta das muitas feitas a mim que não sabia responder. Sempre fui movido por uma passagem bíblica. “Há quem muito foi dado, muito será pedido; há quem muito foi confiado, muito mais será exigido”. Lucas, 12:48.

Sempre vive em base disso, tive uma educação exemplar e base familiar. Melhores escolas e bons amigos que me ajudaram nas mais várias oportunidades. Obtive minha graduação e emendei em minha pós, que logo virou mestrado e se transformou em doutorado com especializações no exterior, que consegui com o meu emprego público. Sou católico desde que nasci e não falto uma missa aos domingos e ajudo em que posso os grupos que já participei antes de me casar com uma mulher sem religião.

E com toda a minha bagagem de vida só conseguia sair uma coisa de minha mente.

- Só pode ser o apocalipse meu amor.

Ao contrário de todos em minha volta, fui incapaz de chorar, rezar ou sentir qualquer tipo de medo. O mundo está acabando em minha volta e a única coisa que consigo pensar é que como minha mulher fica linda com a luz da lava que destrói o meu bairro. O fim chegou e estou tranqüilo, o que mais posso dizer além que fiz o meu dever?

Então os Cavaleiros se alinham e começam a finalizar o seu lindo discurso, mas agora ao invés de não compreender o que dizem, eu consigo perceber que até o mais idiota dos seres humanos, conseguiria entender o que estava acontecendo. A minha suspeita sai do campo da especulação e entrou no campo da certeza, quando um dos cavaleiros se expressou:

- Ora, o último inimigo que há de ser aniquilado é a morte!

Normalmente vindo de um cavaleiro do apocalipse, essa frase seria motivo de comemoração, mas já deu para perceber que serão poucos dignos para aniquilar a morte. Dessa vez eu não consegui me conter após se abraçar com minha mulher. Eu vou morrer ou vencerei a morte? Tenho algo a vencer ou só tenho a perder? Chorei, chorei ao ver os olhos de minha mulher cheios de lágrimas.

De repente sou atraído para a minha frente e vejo a figura de um homem em minha frente. Nunca pensei que conseguiria ver a bondade em pessoa em minha frente, mas eu vi. Não tinha dúvida alguma que em minha frente estava Jesus Cristo, mas ao contrário que imaginei, não o encontrei rindo ou feliz, ele estava triste e angustiado e como chegou sumiu de nossas frentes e houve dois segundos de silêncio.

Meu coração queria disparar, mas só conseguiu ficar com seu batimento calmo e ritmado. Queria gritar e me mexer, mas só conseguia ficar imóvel e calado. Queria olhar em toda a minha volta, mas só conseguia olhar para o alto, pois era pro alto que eu estava indo. Estava flutuando como algumas pessoas em minha volta, mas não estava voando. Estava sentindo uma mão dura e quente que me levantava sem nenhum esforço.

Subia e subia e só conseguia subir cada vez mais, e quando quase não dava para ver quem estava no chão, eu avistei a minha esposa. Minha esposa, meu cunhado e sua esposa estavam ao chão e olhando para mim aos prantos, e eu só conseguia subir cada vez mais.

Mas o meu coração ritmado foi ficando cada vez mais acelerado.

Mas minha voz abafada conseguia cada vez mais reproduzir um som que aumentava com o tempo, até se transformar em grito.

Mas meu corpo imóvel se debatia em movimentos leves, que logo se transformaram em movimentos descontroláveis e violentos.

E só conseguia olhar pra região que se encontrava minha mulher.

Chegou a um ponto em que todos só conseguiam olhar para mim e fui cercado por pássaros. Pássaros não. Tinham asas e voavam, mas não eram pássaros, eram anjos, tem forma humana e são figuras intimidadoras, mas como Jesus, eles são lindos pelo tamanho de sua bondade que escorrem pelos seus olhos.

- Porque está tão triste e perturbado?

- Fique feliz irmão, está indo para a casa do Senhor!

Eu consegui ficar mais desesperado nesse momento, se eu estava indo para o paraíso, para onde estava indo minha mulher?

- Minha mulher ficou! Minha mulher ficou! Eu preciso ir buscá-la! Eu preciso!

Os anjos se olharam e com tranqüilidade exclamaram.

- Calma irmão, o apocalipse chegou separando os justos dos não justos e cada um terá o fim que fez por merecer.

Eu fiquei perplexo ao ter a certeza donde minha mulher estava indo.

- Eu preciso buscá-la, ela não pode ir pro inferno, não pode, eu a amo!

O Anjo me tocou e eu fiquei totalmente imóvel e calmo nesse momento.

- Você não está perdendo o seu amor, você está indo em direção do amor!

Outro me olhou e disse.

- Deus é amor, e é lá que você vai viver de amor!

Nessa hora eu não me debati ou gritei, simplesmente eu respondi.

- Como eu posso viver no amor, se esse amor me faz perder a causa de conhecê-lo?

Os anjos recuaram nessa hora e conversaram entre si.

Então um deles me tirou uma espada de um espaço que desconheço e entregou em minhas mãos e disse:

- Então irmão, busque o mensageiro do seu amor para viver no grande amor.

Eu segurei o objeto metálico mais exuberante que vi em toda a minha vida, aquele metal era tão lindo que tive certeza que não era metal, então perguntei.

- Por que essa espada?

O anjo abaixou a cabeça e respondeu.

- Não vejo possibilidade de entregar um justo no mundo dos injustos, sem ao menos poder se defender.

Nessa hora a mão que me levantava desapareceu da palma dos meus pés e eu cai como um foguete em direção ao chão. Caí muito rápido, como uma bala de guerra percorrendo uma parte do campo de batalha e cai. Cai no chão com um baque tão grande, que a terra tremeu mais com minha queda, do que com os anteriores terremotos.

Então me levantei com a espada na mão e vi o meu amor chorando de joelhos no chão, mas ao contrario do que pensava, ela não olhava para mim, ela chorava e olhava para frente. Então resolvi olhar para a frente e tive uma figura diferente de todas que tinham visto no apocalipse.

Em minha frente estava um homem alto e lindo, mas em seus olhos, eu não via amor. Pelo contrário eu via algo tão ruim, que eu nem sei como descrever em palavras.

- Eu virei cavaleiro da lua quando abriram as portas do inferno, e lutei com o diabo na rua em que deus decretou o eterno.

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Texto de Leandro Ferreira

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12 de abril de 2011

Meus Atos

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Texto de Leandro Ferreira

Nunca entendi a vida e sempre me achei uma ilha.

Sempre sonhei com o desejo de sentar em minha poltrona comprada num site com coisas usadas e ver minha TV gigante que adquiri em mais uma das milhares de vitrines de um shopping. Depois beber uma cerveja gelada e um salgado espertamente fritado num segredo digno de expert de cozinha e com isso poder ver os meus ídolos viverem as suas vidas dentro de minha tela.

Mas a vida nunca deixava isso acontecer, pois sempre tinha alguma alma abençoada que não permitia tal sonho ser vivido. Trabalho o dia inteiro que nem um condenado para conseguir minha bela remuneração ao fim do mês e não reclamo de tal sorte, já que tenho consciência que não é para todos.

No trabalho sempre tinha uma alma me chamando para algo após o expediente, e em minha cabeça não conseguia entender tal fato. Como? Como que depois de quase dez horas de trabalho em cinco dias de uma semana, alguém ainda ia querer passar o restante do seu tempo com a pessoa que dominou seu olhar nesse tempo? Por muito tempo eu disse não a essas almas e com o mesmo tempo eu consegui me livrar desse farto e correr pro meu sonho.

Mas a vida nunca deixava isso acontecer, pois sempre tinha alguma alma abençoada que não permitia tal sonho ser vivido. Chego em casa todos os dias tarde da noite e minha mulher e meus filhos sempre tinham algo pra mim fazer, que adiava meu sonho. Aí você me perguntar dos fins de semanas? Fins de semanas eram piores que os fins dos dias da semana, pois ao menos nesses dias a minha família entendia meu cansaço, já no fim de semana não tinha dó da minha existência e disputavam em guerras minha presença.

Depois de muito tempo aceitando tal fato resolvi dar um basta me apegando ao exemplo do trabalho, e comecei a falar não o tempo todo. No começo foram muitos choros e brigas, mas pouco a pouco ia conseguindo ao menos curtir um pouco do meu sonho. Meus filhos foram crescendo e se acostumando com a idéia e minha mulher foi de dia em dia abaixando o seu tom de voz e também foi aceitando.

Sempre ouvi que toda a tempestade termina em calmaria, mas antes que digam que o ditado não é assim, eu digo que o ditado é do jeito que eu quiser. E depois da grande tempestade, veio a enorme calmaria. Finalmente consegui realizar o meu grande sonho e ter meu momento de paz. Foi um mês maravilhoso, pois meus filhos já crescidos não paravam em casa e minha mulher quando não estava dormindo com dor de cabeça, estava aproveitando a noite com as amigas.

Curti finais de futebol e de vários outros esportes, curti novelas, filmes, séries e programas de TV. Me diverti com as maiores comédias pastelões e me emocionei com os maiores dramas da vida. Me indignei com a violência do cotidiano e me deliciei com as voltas da vida, sempre em alto definição e sempre enormes em minha frente.

Era uma sexta-feira e estava muito feliz, pois teria essa noite e mais um fim de semana inteiro com meu sonho. Quando cheguei em casa senti algo diferente, senti que a casa tinha perdido algo e estava muito leve. Senti como se tivesse perdido toda a sua gordura, senti como se tivesse perdido sua alma. Senti um vento frio e senti certa solidão, mas ao ver minha TV esqueci esse problema.

Estava passando um compacto do jogo do Fluminense, o meu time de guerreiro e lembrei do tempo em que o namorado da minha filha vinha assisti o jogo aqui comigo. Ele namora a minha filha a anos e ficou noivo dela faz pouco tempo. Fiquei muito feliz, pois aprovo muito o garoto que além de ser tricolor das laranjeiras era educado, trabalhador e responsável. Ele terminou a faculdade e passou num concurso público da Petrobras e teve que sair do Rio de Janeiro e se mudar pra Macaé, então pediu minha filha em casamento e a levou com ela. Lembro que fiquei tão feliz nesse dia que até esqueci o final da novela, mas por sorte passou no sábado e pude conferir.

Nesse pensamento de mudança eu me lembrei do meu filho que sempre teve um sonho de biólogo marinho e lutou tanto por esse sonho, que conseguiu uma bolsa de estudos na Austrália. Teve uma grande festa aqui em casa dada por mim, lembro que chamei a todos e fiz uma festa que foi até de manhã. Fiquei tão feliz que perdi a final do basquete, mas também não liguei, pois meu canal de esporte sempre reprisa no dia seguinte.

Peguei a minha cerveja e liguei a minha TV e logo tinha esquecido tudo isso, passou umas duas horas em meus programas e senti uma fome. Então fui ao banheiro e após fui a cozinha e percebi algo estranho. A cozinha estava limpa e sem nenhum sinal de vida, então lembrei da minha mulher e procurei algum recado que dizia que ela sairia com suas amigas. Procurei e procurei e nada achei, então peguei o telefone e liguei pro celular dela, que chamou e chamou.

Então subi pro nosso quarto e ele também estava impecável, mas estava com um clima de vazio, sendo que aquela sensação de leveza em meu quarto e me arrepiei todo. Comecei a perceber que estava faltando alguma coisa, mas não conseguia me lembrar o que não estava lá, então abri o armário e vi ele quase vazio e fiquei desesperado. Só que percebi uma carta no fundo do armário ao lado do meu sapato velho e sem cima das minhas poucas roupas penduradas.

Com pânico no coração eu a abri e comecei a ler em minha mente perturbada.

Oi meu antigo amor.

Pra dar ponto final a nossa linda história de amor, eu resolvi dar um ponto final com uma poesia.

"Um homem que não queria chegou a minha vida

Senti ao meu coração que eu não o queria.

Mas com o tempo só percebi o inverso

Esse homem era tudo que mais almejava

O tempo passou e o sentimento confirmou

Não há nada mais quero nesse mundo

Duas provas de amor brotaram de mim

Duas flores lindas cresceram no jardim

O tempo chegou e o cansaço de carona

E só alguns esboço e pequenos flashes

Minha carcaça conseguia

Me recuso a ter um amor e me contentar com migalhas

Então encerro nossa história

Pois prefiro ter nada do que ter pequenas esmolas.

Te amo e pra sempre o farei

Mas infelizmente nunca mais será ao seu lado.

Adeus meu grande amor"

Nunca entendi a vida e agora me sinto uma ilha.

Chorei.

Não conseguir fazer mais nada no fim de semana além de chorar. Sempre sonhei com um sonho a realizar e me esforcei tanto pra conquistar, que acordei de um sonho que vivia e que agora não poderei mais retornar. Sempre adorei minha TV, mas esqueci de que foi com o meu filho que comprei, pois por conta própria nunca vou a shopping. Sempre adorei a minha poltrona, mas esqueci de que foi com minha filha que comprei, pois nunca navego pela internet. Sempre adorei minha mulher, não por ela me dar os salgados e comprar a minha cerveja, mas sim por estar sempre ao meu lado enquanto fazia todas essas coisas.

16 de março de 2011

Todo Menino é um Rei

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Texto de Erick Villas

O menino pediu a irmã mais velha para o levar na rua para soltar pipa. Era quinta , tarde ensolarada. O sol brilhava as três como se fosse meio – dia. A pipa simples branca e azul com rabiola de plástico e cabresto de dois. Linha sem cerol , o menino era de apartamento e sempre olhou da janela a criançada controlando o destino desses passarinhos de papel. Mas uma tarde ele disse assim:

- Maninha eu vou para a rua!

E a irmã espantou-se e indagou.

-  Que isso menino , fazer o que na rua? lá fora é tão perigoso é melhor você ficar aqui no conforto da nossa casa.

Na grandeza de sua inocência o menino explicou.

-  Quero soltar pipa. Olha só maninha! lá fora não é perigoso nada e fica calma que eu te protejo.

A irmã na pequenez de sua experiência tentou assustar e se impor.

-  Garoto você não sabe o que está dizendo! Na rua tem é muito bandido, gente que rouba criancinha, carros passando toda hora, e além do mais esses meninos que soltam pipa brigam e tudo e só por causa de um pedaço de papel que voa um instante e no outro cai... porque assim é a vida garoto.  

O menino caiu numa gargalhada sem tamanho, riu, mas riu tanto que chegou a faltar o ar e dois segundos de pausa e tornou a gargalhar, deixando sua irmã enfurecida e sem entender.  Até que então ela bradou!

- Moleque você está rindo de quê? É perigoso sim! eu sei o que estou falando já vi muitos casos de morte por causa de pipa sabia, esse cerol que vocês usam pode até matar, eu como sua irmã mais velha estou te protegendo! Ouviu bem? PRO–TE–GEN-DO e não insiste por que eu sei o que eu estou falando.

Depois dos gritos desafinados da maninha mais velha o menino rolou no chão de tanto rir, mas uma risada tão boa que se comparássemos  sorrisos  com notas musicais, a gargalhada do menino seria como uma sinfonia de Villa Lobos. E num ímpeto infantil da experiente irmã mais velha , ela tomou uma atitude drástica para calar os sorrisos musicais do menino , do menino que só queria empinar uma pipa.  Ela quebrou a pipa do menino. Ai menino parou de rir e ensinou.

- Se ser prudente é não acreditar que o vento poderia estar ao menos uma vez ao meu favor, obrigado por quebrar a minha pipinha. Vou voltar pro video-game.

12 de março de 2011

E de Repente

Texto de Erick Villas

- Você tem que entender que eles são a minha família! Você vai ter que aceitar.

- Mas eu sou sua noiva, sua mulher! A gente vai formar uma família.

- Você tem que aceitar.

- Não! Você que tem que aceitar.

Madrugada de ontem, Tóquio. Ele enfurecido e exageradamente com a razão vira-se de lado e dorme. Ela enfurecida e exageradamente com a razão se levanta, se veste e vai embora. Para Sendai, cidade um pouco distante dali.

Hoje, quando acordou percebeu que dormiu com dois travesseiros, sente, levemente, a falta da voz rouca que o ordenava a se levantar para aproveitar o dia. Após tal falta, sentiu um alívio de poder acordar a hora que teve vontade. E seguiu fazendo apenas o que queria. Encomendou o café da manhã no fast food, jogou o seu X-Box360 deitado na cama antes de arrumá-la. E apenas no instante seguinte não se permitiu fazer o que queria... Bateu uma vontade de escutar a tal voz rouca. MAS NÃO, JAMAIS! Ele estava certo, exageradamente com a razão, de forma alguma daria o braço a torcer.

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Dela nada se sabia ainda.

E de repente, em Tóquio, a terra começou a tremer, e o seu porta retrato novo ainda ensacado e sem foto alguma, caiu da prateleira e se quebrou. Mas ele não se preocupou muito, no Japão tremores são tão normais como nos relacionamentos. Porém, ao ver que o tremor continuava e sua intensidade crescia, ele percebeu que estava acontecendo algo diferente.

E de repente, o vídeo game perdeu a graça, e ainda com a cama desarrumada ele ligou no canal oito, e transcorria o relato de uma trágica notícia:

- Um forte terremoto de 8,9 graus de magnitude atingiu nesta sexta-feira a costa nordeste do Japão, Sendai foi exageradamente atingida.

Acompanhando o texto em off da repórter atônita, imagens de uma cidade se desfazendo como se fosse isopor em plena luz da tarde.

- Por conta do terremoto criou-se uma tsunami com ondas que vinham com uma velocidade de 800km/h, exageradamente rápidas e destrutivas.

Nesse momento a respiração dele fica ofegante, e o coração dele aceleradíssimo, sua garganta seca e sentia um grande desespero. Ela reside em Sendai! Não acordou ao seu lado, ela se foi por estar exageradamente certa. E, ele a deixou partir por estar exageradamente certo.

Pegou o celular, discou e a ligação não completou. Mas como? Japão é o berço tecnológico e o celular não funciona? Mas como? Japão berço tecnológico e não previram esse desastre natural. Mas como? Os seres humanos tão inteligentes e justos. Julgadores de si mesmos, sempre exageradamente com a razão encontram-se a mercê da natureza?

Que fruto foi esse mordido por eles que agora os expulsam do paraíso da normalidade. Aonde eles podem dar-se ao luxo de estarem certos. E por isso, sustentar a torre de babel do orgulho, da vaidade. O terremoto não deixou nada de pé, nem uma torre resistiu.

Até o momento, 337 mortos!

16 de fevereiro de 2011

Pretextos

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Texto de Raiane Mendes

Às vezes queria ter um poder. De apagar tudo isso. Não ter nenhum contato com as pessoas que habitam minha mente e às vezes me fazem cometer indiretamente algumas loucuras. Sim, se não é loucura, é o quê? Se eu estou deitada, lembro. Estudando. Ouvindo música. Ah, como penso nisso! Nessa semana, peguei o metrô. Grande coisa! Alguém diz, quando não observa a magia dos lugares e detalhes que me remetem algumas lembranças. Passaria despercebido se nesse lugar tão peculiar eu não estivesse na direção do seu encontro, da concretização de um algum sonho adolescente. Também não ligaria se nele não recebesse uma ligação sua perguntando minha localização. Como é bom! E pra terminar, se nesse mesmo transporte, você não estivesse me esperando na porta. Vejo-me frágil e utópica, mas esperançosa. Sonhando algo que eu sei que aconteceu. Um encontro. Andando pelas ruas que me fizeram diva por alguns minutos ao vento. Ajeitando minha coluna para parecer mais alta e conferindo o cabelo. Lá estava eu, finalmente. Esguia, sorridente. Eu te encontrei. E quando isso acontece, não acontece nada.

Você está lá e precisa se comportar como mais uma habitante comum desse planeta. Sonhar, naquela hora, não seria muito adequado. A mente fervilhando ideias, inseguranças e expectativas que seriam extrapoladas ou quebradas. O que falar? Mas, Deus, o que faço aqui? Não sei. Mas a felicidade enchia meu peito e eu poderia responder oitocentas perguntas sobre esse êxtase com os olhos brilhando. Sim, perfeito. Bonito? Até mais. Exatamente como eu via em sonhos, e era. Real. Concreto. Olhos, acessórios, boca, nariz. Nariz que sempre admirei. Poderia passar aquelas cinco horas só fazendo isso. Olhar, comemorar, descrever, compor sobre aquilo. Poderia passar deitada em um jardim idiota olhando seus olhos negros se destacarem da paisagem de tirar o fôlego. Eu poderia perder o fôlego. Era isso. Se não perdi, essa história não acabou.

Ainda ofego quando passo e vejo o prédio que você gosta, fotografa. Um prédio que aos meus olhos na infância era mais um que se destacava da baía. Hoje, um símbolo de resistência e sofisticação que você admira. Mas, sério. Por que até a Cidade do México, se eu fosse, me faria lembrar disso? Não sei, é um enigma. Ou a sua pluralidade ou minha capacidade de imaginar todos os lugares estranhos sendo desbravados por mim e você. Esse é meu sonho. Enquanto o vagão se deslocava, eu me emocionava. Sentia o cheiro daquele dia, das pessoas. Pareciam as mesmas. Figurantes que compunham aquele cenário perfeito. Já bem longe, podia ver algum rastro daquela paisagem sendo deixada pra trás. Lá estava ela. Intacta, esperando um novo acontecimento. A minha dúvida a deixa esperar. Espero que continue colorida quando eu retornar. Espero ainda sentir o cheiro do couro, da brisa. Espero ouvir a voz louca cantando. Espero deslizar por aí em qualquer lugar boêmio, que me será digno. Sinceramente, espero outra vez encontrar você